Finitude Podcast — sonhos são ajustáveis

Finitude Podcast
15 min readOct 27, 2020

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{Vinheta da Rádio Guarda-chuva: este podcast é uma produção da Rádio Guarda-chuva. Jornalismo para quem gosta de ouvir. Ouve-se o som de um guarda-chuva abrindo e da chuva caindo}

{Voz masculina: ela é uma filha de alemães, loirinha, de olhos azuis, baixinha, ela tinha 1,55m de altura e… um amor de pessoa}

Apresentadora:

Há 455 dias morria Frida Galera.

Mas pode ser que você não esteja ouvindo este episódio na data de publicação, então podem já ter se passado 500 dias, mil dias, 10 anos.

Mas isso não faz tanta diferença assim.

{A mesma voz masculina: ela faleceu com 63 anos, no dia 30 de julho de 2019. No dia 18 de agosto de 2019 ela faria 64}

Apresentadora:

É que a história da mulher sobre a qual vamos falar hoje transcende tempo… Espaço… Calendários. Frida Galera é uma pessoa que deixou marcas. Há algumas semanas, ela virou um robô. Sim, um robô (!), mas isso eu te conto já, já. Outra marca, inclusive literal, é de uma tatuagem que eu tenho com uma frase dela — sobre a qual eu também vou falar em breve. Fazendo umas contas aqui, eu me espantei ao perceber que convivi com a Frida por poucos meses, e só em algumas ocasiões. O que foi suficiente pra me sentir arrebatada por um poder inexplicável que saía daquela mulher. Que ainda sai de tudo o que ela pensou, amou e realizou.

Eu sou Juliana Dantas e hoje eu vou dividir contigo uma história que eu queria contar desde antes mesmo de eu ter chegado aqui no Finitude.

{TRILHA DE INÍCIO DO EPISÓDIO}

Apresentadora:

Quando teve um diagnóstico de câncer de mama incurável — e que já atingia outros órgãos vitais -, Frida Galera foi considerada paciente terminal — mas dali em diante ainda foram quase dez anos de vida. De MUITA vida.

Só que lá no início, sem plano de saúde, ela peregrinou dois anos pelo sistema público até conseguir que algum médico fizesse exames suficientes para constatar o que ela já havia percebido num autoexame:

{A mesma voz masculina: Um médico numa UBS onde ela foi, ela querendo aprofundar os exames porque na mamografia tava aparecendo alguma coisa. O médico virou pra ela e falou que ela tava precisando de uma pia cheia de louça pra lavar. Que ela não tinha nada, e era só uma calcificação mesmo. Isso foi mais ou menos um ano antes de ela ter o diagnóstico}

Esse é o Jadyr.

{Jadyr: O diagnóstico, principalmente do jeito que foi o dela, já em estágio avançado, o médico falou olha “você tem pouco tempo de vida, provavelmente você já tem metástase, no pulmão e em algum outro órgão… e a sua vida não vai ser muito longa. Quando ela chegou em casa ela chorou bastante. Aí eu simplesmente falei pra ela “escuta, quem é o médico pra te dar um tempo de vida? Eu acho o seguinte, enquanto o homem lá em cima não puxar a sua ficha, você não vai subir. Tudo tem o seu tempo, tudo tem a sua hora. Existe o tratamento? Existe. Então vamos juntos, vamos atrás disso. Nós fizemos tudo junto até agora, não vai ser agora que você vai tentar fazer as coisas sozinha.}

Apresentadora:

Esse “tudo junto” aí que ele disse vinha de longa data.

{Jadyr: Nós nos conhecemos em 1974, começamos a namorar em 1975, nos casamos em 1983 e ela me deixou em 2019…}

Apresentadora:

A gente vai lá pros anos 80.

{Jadyr: Bem, após o nosso casamento, a nossa ideia era esperar um ou dois anos até ter o primeiro filho. Ela até brincava que queria ter quíntuplos, cinco filhos, tudo de uma vez só, pra não ter muito trabalho… Foi engraçado! E a partir do segundo ano a gente tentou, tentou, tentou, ela não engravidava de jeito nenhum. E fazia exame daqui, fazia exame dali, eu cheguei a fazer exame pra ver se o problema não era comigo. Mas não teve jeito. Foi quando, em 89, final de 88, o médico que cuidava dela falou: oh, você vai ter que fazer uma cirurgia, você tem ovário policístico, você toma cuidado pra engravidar, mas larga um pouco de pensar em gravidez… Pensa em alguma outra coisa que você goste de fazer. Até ele brincou: compra um cavalo! Mas no apartamento que a gente morava num dava pra ter cavalo. Na varanda ele não cabia… risos

Apresentadora: aí…

Jadyr: um primo nosso tinha um veleiro e nós fomos conhecer lá no Saco da Ribeira. Saímos e nos apaixonamos na primeira velejada. Aí pesquisamos, pesquisamos, pesquisamos, dinheiro pra comprar um veleiro não tinha. Era muito, muito caro. Bom, até hoje um veleiro novo é caro. Mas na época nem usado tinha pra vender.

Apresentadora: foi quando…

Jadyr: Descobrimos um projetista no Rio de Janeiro que vendia o projeto pra construção amadora. Pra você construir dentro de casa. Em meados de 88, comprei o projeto. Em janeiro de 89 começamos a construção, efetivamente.

Apresentadora: só que…

Jadyr: em abril de 90 a nossa filha nasceu. Então eu até brinco, ele era o nosso filho mais velho. E aí aquele mesmo problema: falta de dinheiro. Porque vem filho, vem despesa, em seguida veio o segundo filho, em 95, nasceu o segundo filho, e o veleiro sempre em segundo plano. Por quê? Como a gente não tinha dinheiro pra terminar ele naquela época, eu falei: vamo manter ele pra aposentadoria porque quando eu comprei o projeto, com pouco dinheiro fazia, só, mas conforme foi desenrolando, era muito dinheiro, não era pouco. Então falei: vamos deixar o veleiro pra nossa aposentadoria. Continuamos velejando com veleiro dos amigos e continuamos mexendo no nosso. Aí quando ela teve o diagnóstico, em 2010, aí bateu o desespero. Eu falei: poxa, tudo nós fizemos em conjunto. Não é justo ela não curtir o veleiro. Nós estávamos fazendo pra nós. Foi aí que eu comecei a ir em cima pra terminar ele. Nós tivemos apoio de amigos, ganhamos doação de muita coisa, muita gente nos ajudou, nós fizemos uma campanha de financiamento coletivo pra colocar o veleiro na água. Em 2014 ele foi pra água.

{Jadyr: A história do nome Augenblick partiu do seguinte: quando ela foi contar pro pai dela, o pai dela era alemão, não falava Português. E ela foi comentar que a gente iria construir um veleiro. Ele olhou bem profundo pra ela assim, o rosto bem sério e respondeu “Augenblick!” Como quem dizia: um momento. Eu achei que vocês fossem construir uma família. Então o Augenblick é um momento, um instante. E se você traduzir ao pé da letra, “augen”, olhos; “blick”, piscar. Então seria um piscar de olhos. E ele nada mais é do que isso: ele é um piscar de olhos no meio do oceano}

Apresentadora: E o Jadyr, que é representante comercial, virou também CAPITÃO.

{Jadyr: Você pra poder pilotar uma embarcação, você tem que ter habilitação, ta? Existem três tipos de habilitação. Você tem habilitação arrais, que é pra você navegar em rios e represas. Você tem habilitação de mestre. Mestre você pode navegar ao longo da costa, até 20 milhas da costa, e você tem de capitão. A de capitão é pra você fazer travessia oceânica. Nós tiramos, eu e ela juntos, o arrais e o mestre. Ela era mestre, ela podia navegar até 20 milhas da costa. E aí, como a ideia nossa era dar a volta ao mundo no veleiro, precisava de capitão. E aí nós dois fizemos o curso. É um curso muito difícil, é muito estudo. E aí eu passei e ela não. Ela tentou duas vezes a prova da Marinha e não conseguiu ser aprovada. Porque pra gente dar a volta ao mundo, a gente tinha que ter capitão. Eu brincava com ela: eu sou o capitão, mas você é a minha almiranta. Então você tem que ter habilitação também. Só que infelizmente não deu tempo de ela tirar.}

Apresentadora: O Augenblick fica atracado em Ilhabela, no litoral de São Paulo:

{Jadyr: Ela ia, sentava lá na frente, na proa do barco, punha os pezinhos pra fora, e ficava sentindo o vento no rosto. Ela falava: isso é a coisa mais maravilhosa do mundo. Você sentir a vida. Sentir a vida passando por você. Porque o veleiro, como você não tem motor, você não tem barulho. Quer dizer, motor tem, mas a gente não usa. Você não tem barulho… Então você sente a brisa no rosto — e isso pra ela era a coisa mais maravilhosa do mundo.}

Apresentadora: O veleiro vai pra água, o sonho se realiza e fim, né? Não. Pelo contrário. Foi aí que mais um capítulo começou.

{Jadyr: A história do veleiro nós contamos em duas palestras que fizemos lá no hospital onde ela se tratava, que era o Pérola Byigton. E, durante a palestra, nós tínhamos fotos, nós tínhamos muitas fotos do veleiro — e eram projetadas as fotos no telão. E, quando terminavam as palestras, ela ouvia muitos comentários das pacientes, “poxa, nunca pensei que isso podia acontecer, olha que bonito, mas não vou viver pra velejar, não vou sentir isso que ela fala”. E aí ela chegou em casa falando. Falei: olha, condição dá pra gente fazer. Só que o problema é o preço. Porque o veleiro fica lá em Ilhabela. Falei: pra gente levar as mulheres até Ilhabela, tudo bem, botamos no nosso carro e vamos pra lá, passamos um fim de semana com elas. Só que a ideia é uma coisa e a prática é outra totalmente diferente. São pacientes. Pacientes com uma doença grave. Você não pode simplesmente pegar, colocar no teu carro e levar. A vela é um esporte perigoso. Pra quem não tem noção. O nosso veleiro não é um veleiro muito grande. Existem riscos pra você levar. E aí começaram a jogar uma ducha de água gelada em cima da gente. Que não dava, o risco, nós podíamos tomar um processo por qualquer acidente que tivesse, enfim. Uma série de problemas.}

Apresentadora:

Aqui eu faço uma interrupção pra te contar que eu me apaixonei pela Fri bem na hora em que ouvi essa história da boca dela. Foi numa palestra, no dia em que a conheci e conheci o Jadyr, que me foram apresentados pelo Tom Almeida, nosso colunista, criador do movimento inFINITO.

Eu tava ali na plateia, sentada com meu bloquinho, vidrada ouvindo ela falar e anotando freneticamente. A voz doce e calma era um contraste com toda aquela potência do que ela dizia. Eu continuava anotando loucamente.

Quando ela estava nesta parte da história que o Jadyr ta contando agora, ela falou assim: aí eu estava contando do meu sonho e uma mulher se aproximou de mim e disse: e o meu sonho, sabe qual é? Ela disse: não… “Meu sonho um dia era só ver um veleiro, pq eu nunca vi um de perto”…

{TRILHA SONORA DE PIANO}

Aquilo caiu com um piano pra Frida. E foi quando, na palestra, ela disse que “sonhos são ajustáveis”. E aí isso caiu como um piano PRA MIM. Eu comecei a rever tanta coisa, tanta coisa. A nossa falsa sensação de controle da vida. A nossa autocobrança. O sarrafo lá no alto, os planos que não podem sair um milímetro do previsto. Anotei a frase no bloquinho e, algum tempo depois, na minha pele. Ta aqui, entre meu pescoço e o meu ombro esquerdo, naquela parte que costuma ficar mais tensa, sabe? “Sonhos são ajustáveis”. E depois, em outro momento, vendo que eu fiquei impactada com a frase, a Frida me respondeu “e os ajustes são ilimitados”.

Frida e Jadyr ajustaram os sonhos. E, mais uma vez, contaram com a ajuda de amigos.

{Jadyr: Se vocês quiserem usar os meus veleiros, seis veleiros na Guarapiranga. Durante a semana eu cedo os meus veleiros pra vocês levarem as mulheres pra passear. Aí já começou a ficar um negócio fácil, factível pra gente fazer dentro das nossas posses. E aí começamos a colocar tudo num papel, tudo o que precisava, enfim. E aí nós começamos a levar as mulheres pra passear não no nosso veleiro, mas no clube na represa de Guarapiranga, onde normalmente tem voluntários pra comandar os veleiros, os veleiros são cedidos, não pagamos um centavo pelos veleiros.}

Apresentadora: A Guarapiranga, pra quem não conhece, fica no extremo sul da capital paulista. Foi nas águas dessa represa em que o projeto Velejando contra o câncer de mama ganhou corpo. A Frida quis que mulheres de baixa renda, com câncer avançado, tivessem a mesma oportunidade que ela de sentir o vento batendo no rosto a bordo de um veleiro. Uma vez, eu fui junto. Eu e uma parceira jornalista de outras jornadas, a Natália André.

Tava UM FRIO.

UMA chuva que não parava nunca mais. Tinha a expectativa de que o tempo chegasse a abrir à tarde. Enquanto isso a minha frustração só aumentava. O sol não apareceu. A chuva não parou.

Ao contrário de mim, a Frida não tava frustrada. Claro que ela preferia ter velejado com as mulheres todas que foram mas, pra ela, só de estar ali, tomando um café, comendo um bolinho, vendo os barcos na água, já era vida. “Até os dias de chuva têm o seu valor”, ela me disse. Pra quem já estava no vigésimo quarto protocolo diferente de quimioterapia, uma tempestade literal não era nada.

{Jadyr: Pra você ter uma ideia, tinha situações em que ela fazia quimioterapia, e algumas químios dão efeitos colaterais fortes. Ela preferia passar a bordo do veleiro todos os efeitos do que dentro de casa. Enjoo é coisa típica de veleiro e típica de quimioterapia. Mas ela não se importava. A gente ia nós dois, a gente acaba às vezes nem saindo da poita, um tipo de uma âncora, e às vezes a gente nem saía, a gente ficava lá, passava sábado e domingo só pra sentir o ventinho. Sentir o vento, vendo as tartarugas, que toda manhã a tartaruga vinha lá dar um oi pra gente… Então é sentir a natureza. E isso não dá descrever.}

Aquela foi a última vez da Frida na represa. Apesar da dificuldade em captar verba e de toda a logística, que envolve apoio médico, comes, bebes, gasolina e tudo mais, o projeto segue firme. Com interrupção durante a pandemia, claro, mas faz parte dos planos do Jadyr. Porque sonhos… sonhos são ajustáveis.

{Jadyr: Começou a se ajustar quando nós começamos o projeto. A ideia nossa era construir o barco em quatro anos, só que quando nós fomos ver o valor, precisava de 30 anos, não quatro, risos. Porque o valor era muito alto. Aí nós ajustamos o nosso sonho pra aposentadoria. Aí vieram os filhos, tudo. Quando veio o câncer, novamente nós tivemos que ajustar o nosso sonho. A gente sabia que a possibilidade de dar a volta ao mundo seria muito difícil. Então, vamos ajustar o nosso sonho. Subir a costa do Brasil e ir até o Caribe. Enfim, tudo que a gente tentava fazer e não conseguia, a gente falava “não, vamos ajustar. desistir, nunca. ajustar, sempre.” A gente até fala que um bom velejador, ele não consegue mudar o vento mas, sim, ajustar as velas.}

O Patrick, o filho da Frida, tem se dedicado a ajustes pra poder ele mesmo completar o sonho da mãe.

{Jadyr: Ele já ta acompanhando alguns velejadores fora do Brasil, brasileiros que estão fazendo isso que ele pretende fazer e já ta fazendo o roteiro e tudo. E quer que eu vá junto. Então vamos ver se a gente vai conseguir fazer isso. Pelo menos realizar o sonho dela, já que ela não conseguiu fazer com o veleiro, a gente fazer. Então ele ta se dedicando bastante, ele se forma no final do ano que vem na faculdade, e aí nós vamos começar a cuidar da logística, porque pra você fazer uma volta ao mundo são pelo menos dois anos de tempo. Porque o veleiro não vai numa velocidade muito grande. A velocidade médica de um veleiro em travessia, com vento razoável é de cinco nós. Nós estamos falando de 8, 9 quilômetros por hora. Então você ter que ter tempo.}

Enquanto isso, a Frida inspira outras ações. E acaba de virar um robô. Essa história eu te conto daqui a pouquinho mas, antes, alguns recados.

{TRILHA BREAK}

Nesta quarta-feira sai mais um episódio da Rádio Escafandro, do Tomás Chiaverini, nosso parceiro de Rádio Guarda-chuva. O neurocientista Sidarta Ribeiro conversou com o Tomas sobre sonhos. Mas sob uma perspectiva um pouquinho diferente da que estamos falando aqui hoje. O Sidarta falou sobre como os sonhos moldaram a nossa civilização e a nossa espécie. Vale a pena ouvir.

Voltando ao Fini, eu queria te convidar a considerar colaborar com o nosso financiamento coletivo. Entra lá em apoia.se/finitudepodcast e aí você avalia, que tal? A partir de 10 reais você já dá uma força e tanto aqui pra gente e ainda passa a receber a nossa newsletter semanal. Se você quiser fechar uma parceria comercial aqui com o nosso conteúdo, me escreve por e-mail finitudepodcast@gmail.com.

{FIM DA TRILHA DO BREAK}

A Frida se orgulhava muito ao contar que tinha feito amizade em todos os andares do Hospital Pérola Byigton, na região central de São Paulo. Uma dessas amigas, também paciente e ativista, é a artista Vilma Kano. Ela desenvolveu uma nova versão da Frida que voltou a passear pelos corredores, a Frida Robô, que surgiu diante dos desafios da pandemia:

{Vilma Kano: Ela funciona com controle remoto de viodeogame, a gente encaixa um celular e o nosso rosto aparece no vídeo. No rostinho da Frida pode aparecer o rosto da gente que ta pilotando ela. E a gente pode interagir com o paciente em tempo real. às vezes as pessoas podem pensar “ah, um robô, um robô fazendo doação, é uma coisa muito fria.” Não, gente, não é.}

Apresentadora: A Frida tem um compartimento que leva presentes. Lenços, hidratantes, maquiagem. E sorrisos, como a Frida de verdade fazia.

{Vilma Kano: A Frida Robô representa todos os projetos que nós imaginávamos fazer juntas e que não deu tempo. A Frida representa tudo aquilo que não deu tempo de a gente criar e de a gente tocar adiante. Acho que a Frida é a esperança.}

{Jadyr: Ela pesquisava, ela ia atrás…}

Jadyr de novo:

{Jadyr: e todo o conhecimento dela, ela passava pra frente. E a gente até brinca: dessa vida, você não leva nada}

Apresentadora:

E aqui.. Eu queria deixar um recado da própria Frida, de um vídeo que foi gravado naquele dia na represa, sobre o qual eu falei mais cedo. A chuva, como eu disse, ta forte, dá pra ouvir o barulho, mas não o suficiente pra encobrir a mensagem dela:

{Frida Galera: “Sentir a brisa é vida. Você estar no comando de um veleiro é como se você estivesse no comando da sua vida. É você que leva a sua vida, é você que direciona pra onde a sua vida deve caminhar.”}

Apresentadora: Frida Galera viveu bem. Frida Galera morreu bem, sob cuidados paliativos, cercada por quem amava. Conseguiu, até, no último suspiro, estar com a cadelinha que era o xodó dela. Tudo conforme previsto no testamento vital que ela deixou. Se você quiser ter acesso, a gente leu este conteúdo no episódio Testamento Vital, publicado em 2019.

Não dá pra saber se a história teria sido diferente se o diagnóstico de câncer de mama tivesse acontecido mais cedo, sem que houvesse aqueles dois anos de peregrinação no sistema público de saúde em busca de todos os exames. Em Outubro, a gente ta acostumado a ver os mais importantes monumentos iluminados de rosa, digital influencers com o lacinho cor-de-rosa no perfil do Instagram, nos jornais, no rádio, na tv e na internet, repete-se sobre a importância da detecção precoce da enfermidade. Que é importante, ninguém discute. Mas como avançar nessa conversa pelo acesso ao DIREITO a um diagnóstico preciso e a um tratamento digno? Vale lembrar que, no Brasil, apenas um quarto da população tem plano de saúde. Em paralelo a isso, de 2020 até 2022, estima-se que haverá cerca de 200 mil novos casos de câncer de mama aqui no país. Caso você esteja passando por alguma situação complicada neste sentido ou conhece quem precise de ajuda, uma das dicas que eu dou é pra que você veja o Instituto Oncoguia. Oncoguia.org.br é o portal onde há todas as informações que você precisa saber não só sobre câncer de mama, como sobre todos os outros tipos de câncer.

Bom, estamos chegando ao final deste episódio, mas não sem antes ouvir o Fininho.

{O motivo que me traz aqui, como todos sabem, é a morte}

{TRILHA FININHO}

{A morte exige respeito. A morte exige de nós profunda reflexão.}

Coveiro.

Filósofo.

Colunista aqui do Finitude.

{O que marca a minha fala hoje é a diminuição dos sepultamentos de Covid. O que nos causa algum alento, mas mantém acesa a chama da preocupação, a chama da tensão, do cuidado. Mas não só o cuidado comigo mesmo, o cuidado com os outros, o cuidado com a fala, o cuidado com o olhar, o cuidado com os gestos. O cuidado com a vida. Sim, tem diminuído, sim, os enterros por Covid, mas essa diminuição ainda não é tão significativa quanto uns já presumem.}

A quantidade de pessoas vítimas da Covid-19 no Brasil é assustadora: estamos perto da triste marca de 160 mil mortos. Mas, aos poucos, ainda bem, a curva que aponta mortes pelo coronavírus aqui no Brasil vai caindo. Fora dos gráficos e tabelas, tem a experiência de quem viu a vida virar do avesso em 2020, no front da pandemia. O Fininho me contou que, no Cemitério da Penha, na zona leste de São Paulo, onde ele trabalha, na fase mais brava do coronavírus, chegava a acontecer cerca de 10 enterros pela doença só lá, que nem é o cemitério mais movimentado da cidade. Agora, ele chega a passar dois ou três dias sem nenhum enterro pela Covid.

{É muito cedo ainda pra que nós baixemos a guarda, pra que a gente a passe a pensar que já superamos o Covid. Ainda não. Ainda há muita dor, de tantos mortos. É uma coisa incalculável, imensurável, mas tantas perdas devem servir também como alicerce para a construção de um novo tempo, de uma nova esperança, uma nova perspectiva de humanidade. Ser humano. Eu acho que temos tudo isso pra diante e, se contarmos com todos, teremos certamente, menos sepultamentos de Covid. Menos dor, menos angústia, menos tristeza, menos mortos para contar.}

{TRILHA FINAL}

Apresentadora:

Eu me despeço não sem antes agradecer pela torcida de todos os ouvintes, de todo mundo que confia no nosso trabalho. O Finitude levou a Menção Honrosa na Categoria Áudio do Prêmio Vladimir Herzog pelo episódio Confinamento: 3 meses depois. A premiação aconteceu no fim de semana e a gente ta só amor por este projeto, por quem acredita que falar de envelhecimento, cuidados paliativos, morte e luto também é falar de Direitos Humanos. Brigada, de verdade.

O roteiro completo de hoje, com a transcrição das entrevistas, está no link do Medium, que eu postei na descrição deste episódio. Aproveita pra indicar pras pessoas com deficiência auditiva que você conhece. Assim, elas passam a ter acesso também a conteúdo de podcast :)

Por aqui eu volto na terça que vem. Até lá, você me encontra como finitudepodcast no Instagram e PodcastFinitude no Twitter.

Se é assinante do Fini, quinta tem newsletter aí no seu e-mail.

Brigada pela escuta, um beijo pra você.

{Vinheta da rede B9 que diz: este podcast é apresentado por b9.com.br}

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